Lemos com grande interesse o artigo de Abdel‐Ghaffar e colegas1 investigando, em 100 pacientes pediátricos, o uso preemptivo de cetamina nebulizada para controle da dor após amigdalectomia. Esses pacientes relataram eficácia da intervenção no alívio da dor pós‐tonsilectomia e a nebulização é uma via de administração alternativa à cetamina intravenosa (IV). O relato constitui progresso muito importante na técnica anestésica para tonsilectomia, pois pode influenciar a escolha da via de administração da medicação e a prevenção da dor pós‐operatória, que se inadequadamente tratada, pode levar à desidratação e hospitalização prolongada. Também pode ser útil para evitar complicações associadas ao uso de opioides sistêmicos e Anti‐Inflamatórios Não Esteroides (AINE), especificamente depressão respiratória, sedação, náuseas, vômitos e interferência no sangramento.
O desfecho primário do estudo foi o consumo de analgésicos de resgate nas primeiras 24 horas pós‐operatórias. Entretanto, gostaríamos de ampliar a discussão e incluir dados relativos à qualidade do sono pós‐operatório, outro parâmetro que também pode ser influenciado pelo uso preemptivo de cetamina nebulizada. O monitoramento da qualidade do sono no pré‐ e pós‐operatório por meio de polissonografia em laboratório do sono, por exemplo, pode detectar qualquer distúrbio do sono previamente inexistente. O distúrbio do sono pode não ser apenas consequência da dor, mas também um agente causador ou fator agravante.2 Assim, maior eficiência do sono e tempo de sono podem ser um sinal de melhora no controle da dor no pós‐operatório.3 Além disso, a associação bidirecional de sono e dor já foi descrita.4
Isso poderia ser estendido a outras cirurgias otorrinolaringológicas pediátricas comuns, como a adenoidectomia. Estudo que descreve procedimento com cetamina nebulizada, semelhante ao usado por Abdel‐Ghaffar e colegas,1 relatou melhora na dor pós‐operatória;5 no entanto, faltam estudos clínicos sobre seus efeitos analgésicos pós‐operatórios na adenoidectomia isolada, e mais estudos são necessários. Esses poderiam considerar o uso da qualidade do sono como uma medida de desfecho.
Apesar dos importantes avanços feitos na compreensão dos mecanismos e tratamento da dor, a dor pós‐operatória continua sendo um problema de saúde e está associada a diversos efeitos adversos. Portanto, é relevante entender se o uso preemptivo de cetamina nebulizada reduz a dor após cirurgias otorrinolaringológicas pediátricas. A administração de cetamina nebulizada é uma prática relativamente recente, e os estudos sobre sua eficácia analgésica na tonsilectomia e adenoidectomia ainda são escassos. Portanto, novos estudos clínicos e experimentais enfocando essas associações específicas devem avaliar múltiplas medidas de desfechos, incluindo a qualidade do sono pós‐operatório. Isso pode ajudar a promover a melhor escolha na via de administração da cetamina e contribuir para a melhor recuperação e prevenção de possíveis complicações.
Conflitos de interesseOs autores declaram não haver conflitos de interesse.
Nossos estudos são apoiados pela Associação Fundo de Incentivo à Pesquisa (AFIP). ST e MLA também receberam apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq).